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Um destes dias surpreendia-me com o facto de José Pedro Vasconcelos apresentar o 5 para a Meia Noite. Ainda gostava de saber como se evolui de Batanete para apresentador de um programa, supostamente, representante da cultura jovem portuguesa que surge por estas alturas.

Quando vi reparei também que o convidado dele ia ser o Ricardo Araújo Pereira, assim sendo e por curiosidade fui ao youtube ver se existia algum snippet da sua aparição. O que encontrei foi isto, publicado pelo próprio programa no Youtube.


Já me ri bastante com o humor dos Gato Fedorento quando era mais novo, diga-se há cerca de cinco ou seis anos atrás e não posso dizer que tenha deixar de encontrar graça em muitas das coisas que eles fizeram, contudo não mais consigo encontrar a frescura e originalidade que tantas vezes lhes é, de forma errada, imputada.

De qualquer das formas, algo mais incrível me saltou à vista no vídeo publicado. Basicamente, este vídeo consiste de várias personalidades que falam de Ricardo Araújo Pereira de forma altamente elogiosa em geral. Então o que é que me saltou à vista?

Aparte dos dois senhores que aparecem no início do vídeo, praticamente todos os outros falam mais de si próprios do que do Ricardo Araújo Pereira.

Mário Soares - "... e além disso, uma pessoa que é amigo de Portugal e sabe o que é ser português." Isto é um texto que me soa recorrente do Mário Soares hoje em dia.

Paula Moura Pinheiro - "... o que ele faz é perturbar tudo o que está instituido, nomeadamente, aquelas verdades indiscutíveis..." e depois procede para falar do aborto e do discurso do Marcelo Rebelo de Sousa, resumindo tudo aquilo que ele possa ter feito (convém não esquecer que os Gato Fedorento não são só o Ricardo Araújo Pereira) a um ponto com o qual, implicitamente, ela está mais de acordo. De cabeça, sem ser fan, lembro-me de meia dúzia de sketchs onde não há verdades indiscutíveis a serem "desmontadas". Ainda diz mais umas parvoíces perdendo todo o capital de simpatia que tinha por ela.

Jerónimo de Sousa - "... ele hoje representa também a capacidade de transformar o humor numa arma carregada de alegria contrariando a ideia do povo fatalista do povo conformado, antes pelo contrário..." "Need we say more?" nas palavras imortais de John Cleese n' O Sentido da Vida. De qualquer das formas discurso à PCP uma coisa qualquer que é afinal uma arma contra a mentalidade insituida do povo fatalista e conformado.

Luís Filipe Vieira - "...Sei que já tens mais alguma experiência que eu, pelo menos já estiveste no Estádio da Luz a jogar (talvez a ver jogar, mas bem) com grandes craques como Rui Costa, Aimar e outros, por isso, é algo que nunca tive essa felicidade..." Ironia em favor próprio.


Obviamente, estas pessoas não estão a falar de si próprios. Estão sim a veicular uma mensagem através de algo que se identificam e não foram objectivas. Supostamente era para falar do Ricardo Araújo Pereira e das suas qualidades. Não para dizer "ah gostei muito de x porque reflecte bastante aquilo que quero dizer" que foi, basicamente o que as pessoas fizeram. 

Mas isto é uma sina que Ricardo Araújo Pereira terá de viver enquanto não se transformar num anónimo. Veja-se, por exemplo, o riso desmedido e completamente artificial do etc Vasconcelos no final do vídeo. É a sina das pessoas acharem o que querem achar e não aquilo devem. É rirem-se o que querem, por pré-definição, em vez de se rirem adequadamente. Eu, por motivos profissionais já "convivi" com o Ricardo Araújo Pereira e, sendo ele uma pessoa bastante bem educada, quem o rodeia não perde oportunidade de se rir excessivamente de pequenas piadas, o que constitui um hábito de pequenez desprezível. Ele, se for tão inteligente como aparenta, sabe e percebe isso. Contudo, se ele for mesmo inteligente também compreenderá o falhanço que o coiso Vasconcelos representa, ainda assim compareceu no programa dele.

Saber e não querer saber

Qualquer pessoa que acompanhasse este blog com relativa regularidade poder-se-á perguntar se os autores do Taste of Orange ainda estão vivos.

A verdade é que estamos, neste caso, estou. A razão de prolongado silêncio tem um motivo, bem válido, que provavelmente se arrastará durante algum tempo.

A convivência humana é um poço infinito de estupidez e palermice. Sempre que me entrego à indulgência de ler, ouvir e até debater invariavelmente deparar-me-ei com essa estupidez, salvo em alguns casos excepcionais em que vale a pena estimular essa convivência, contudo esses casos não são mais que excepções que comprovam a regra.

A minha descrença na humanidade fez com que ao longo dos anos a minha convivência pessoal fosse diminuindo. Estou pouco disponível para conversas e quando estou sou um cavalo sem freio no que às minhas opiniões e inabaláveis convicções diz respeito, o que faz que as outras pessoas fiquem indisponíveis para conversas, pois parece haver muito pouca gente que queira ter uma boa discussão acerca do que quer que seja, limitando-se apenas a dar respostas genéricas como "pois.." ou "sim, realmente..." mas nunca preenchendo as reticências dado que as suas mentes abafadas e bafientas não o permitem.
Vem-me à cabeça um evento em que alguém após uma pergunta acerca da sua opinião sobre certo assunto disse que "as pessoas não simpatizaram muito" nem dando a sua opinião, nem reconhecendo a sua hipocrisia no assunto concreto. Pensar que alguma vez simpatizei com a pessoa em questão cria um coágulo sanguíneo na parte do meu cérebro que avalia a minha própria inteligência, pois simpatizar com tal baixo nível intelectual é chocante.
Ainda assim, este afastamento dessa convivência pessoal não me blinda de ter contacto com palermices. Basta ler uma notícia e ver os comentários da mesma, ouvir outras pessoas a falar, ouvir pessoas a falar no comboio, no trabalho, ler comentários no youtube, ver blogues, observar perfis de facebook etc etc etc.

Lembro-me do jornalista David Walsh, um dos mais persistentes em afirmar que Lance Armstrong usava doping desde a altura da sua primeira vitória no Tour, que sempre que via alguém com a pulseira Livestrong não se conseguia conter em dizer a essa pessoa que ao usar essa pulseira suportava não apenas a luta contra o cancro mas também uma fraude. As pessoas afastavam-se dele após ouvirem as suas teorias, na altura mirabolantes, agora confirmadas com variadas provas.

Eu sou um pouco assim, ou melhor, era. Tenho muita dificuldade em me conter quando ouço/vejo certas estupidezes. Isso era essencialmente aquilo que me motivava mais a escrever no blog, um ventilar do incómodo que me causava o simples facto de certas pessoas simplesmente existirem.

Então, no final de umas saudáveis férias em Julho tomei a decisão de não entrar mais em qualquer rede social, não ler mais os comentários das notícias ou do youtube, usar religiosamente o leitor de MP3 quando vou no comboio e até algumas vezes quando vou a pé para não ter que ouvir as pessoas a falar, basicamente abstraindo-me de ouvir opiniões, excepto aquelas que eu quero ouvir.

Poderão dizer "Ah, mas assim andas apenas a não ouvir e nunca saberás o que se passa à tua volta". Para ter este pensamento é preciso ter já de si uma boa dose de palermice, porque é por saber o que se passa que eu não quero saber mais. Não quero mais ler futilidades em páginas de facebook em que as pessoas cozem a sua vida com linhas de ouro e a sua intelectualidade com linhas de merda resultando num espectáculo macabro de superficialidade. Não quer mais ouvir pessoas a falar do que não sabem, nem quer mais saber daquelas pessoas que usam as opiniões dos outros sem nunca se preocuparem em cimentar a sua própria opinião. Eu sei que isso acontece e não preciso de recalcar isso nem quero.

A necessidade que tenho de contrapor as opiniões absurdas dos outros nunca me causou mal estar. Continuo a ter esse ímpeto quando algo que não posso evitar acontece e tenho de me deparar com essas opiniões, mas pelo menos também sabe bem concentrar-me noutros assuntos. Só tenho pena de não ler muito ultimamente, porque de resto comecei a apreciar coisas que não apreciava dantes e a ter interesse em assuntos que não tinha dantes. E isso é bom e eu sinto-me bem.

Leituras (continuação)

Continuando o post de ontem.

A minha reacção quando vejo as notas de tradutora nos livros do Murakami

Harry Potter and The Deathly Hallows - JK Rowling

O livro final da série, que li toda, obviamente, antes de ver os filmes.

Creio que meio mundo avalia Harry Potter pela qualidade dos filmes que é, diga-se, horrível. Contudo, os filmes não são os livros. Ninguém pode dizer que Harry Potter é um clássico da literatura mundial ou que é algo de transcendente. Não é, se pensarmos como adultos, mas para um livro concebido para jovens é um excelente livro. Creio que a tradução em português não faz jus ao original. Do quarto livro para a frente li sempre em inglês e a escrita torna-se bastante mais envolvente.
A capacidade de Rowling em criar enigmas e de tricotar uma história com vários pormenores que se vão cruzando e descruzando de forma natural é de louvar e não admira que ela tenha enveredado por escrever um policial pois esse tipo de escrita é ideal para os policiais.
Quanto à saga, gostei bastante de ler. É algo que se lê bastante bem e é cativante, sem cair na mediocridade de linguagem ou estilística. Este é o pormenor que para mim diferencia este livro de Twilights e Sherrilins e o diabo a sete.


O Estrangeiro - Albert Camus

Gostei bastante deste livro. A edição que eu li tinha um prefácio de Jean Paul Sartre que me preparou bastante bem para a leitura do livro. Não é difícil de ler e não é aborrecido. É, aliás, bastante ilustrativo do absurdo que Camus defende. Gostei do facto da escrita ser muito simples e descrever um personagem que embora não se possa dizer que seja complexo, era uma personagem suis generis.
De resto tenho por hábito volta e meia dizer que estou a entrar em modo Mersault sempre que me deparo com humanos apalermados.

Underground - Haruki Murakami

Um livro documentário acerca dos atentados de Tóquio com gás Sarin.
Um documento interessantíssimo acerca daquilo que acontece quando há atentados, do ponto de vista humano. Para nós que apenas vemos as notícias, são apenas números, mas para os familiares das vítimas são pessoas que deixaram de ser e que deixaram um vazio impossível de preencher. Impressionaram-me particularmente os testemunhos de um homem cuja irmã ficou em estado quase vegetativo (à altura do livro estava a fazer progressos, mas nunca poderia ter uma vida independente) e que necessitava de cuidados permanentes, e o testemunho de uma mulher cujo marido morreu quando ela estava para dar à luz um filho. É por este tipo de realidade que me repugna quando ouço pessoas a dizer que "isto precisava era de um atentado" ou coisas do género, bastante comuns de se ouvirem.
O livro está dividido em duas partes. O testemunho das vítimas e familiares das vítimas e o testemunho de pessoas que integravam a Aum Shinrikyo, seita responsável pelo atentado. A segunda parte é um testemunho incrível daquilo que o fanatismo é capaz.
Creio que alguma ficção de Murakami é altamente influenciada pelos relatos deste atentado. Não vou estar aqui a dissecar isso, porque não quero dar spoilers, mas a verdade é que Murakami ficou profundamente impressionado com estes testemunhos, por isso seria completamente normal que a ficção dele reflectisse um pouco esses acontecimentos.

E bem, acho que estes foram mesmo os livros que li este ano. Assim de repente não me ocorre mais nenhum, embora talvez seja uma falha de memória.

Leituras

Nunca fui muito de manter diários de leitura.

Não tenho nem paciência nem persistência para manter um diário de leitura nem para ter um perfil de goodreads, como muita gente tem.

Assim sendo, e dado que hoje me apetece falar dos livros que li este ano, que me lembro, venho aqui deixar este post.

Ora então cá vai, sendo que certamente me esquecerei de alguns. Vou começar pelo último que li, desfrutem.






Polikuchka - Tolstoi

Este acabei de ler anteontem. Gostei bastante. Tolstoi é um escritor que me envolve bastante bem nas suas obras. É um conto e é bastante leve e fácil de ler. Se há coisa que não compreendo é algumas pessoas que dizem que a escrita de Tolstoi é muito pesada. Se calhar na Guerra e Paz (que ainda não li) até é, mas em livros como este, Felicidade Familiar, Hussardos, A Morte de Ivan Ilitch ou a Sonata de Kreutzer o estilo é bastante fácil de ler. Talvez o ambiente seja pouco positivo e até um bocado negro em alguns, mas o estilo não é assim tão pesado. Não é pesado de todo, diria.

Calígula e o Equívoco - Albert Camus

Li este livro porque estava a passar férias na casa da minha querida namorada e não queria começar a ler um livro que se arrastasse depois do fim das férias. (essa foi a mesma razão pela qual peguei no Polikuchka para ler, de resto) Já sei que depois das férias o meu ritmo de leitura abranda e, por isso, se pegasse num livro muito grande iria dar um avanço nas férias e depois do fim delas iria arrastar até o acabar.
De qualquer das formas, são duas peças de teatro no mesmo cumprimento de onda de O Estrangeiro. O absurdo continua em evidência, contudo, não achei que as peças fossem assim tão dramáticas (no sentido teatral) nem achei que mostrassem assim tão explicitamente o absurdo da vida. Tudo bem, que ele está lá, mas não parece o assunto central, por assim dizer. Talvez o maior defeito é que quando lemos as primeiras páginas o final já se torna demasiado previsível.

Billy Budd - Herman Melville

Escolhi aqui mais um livro curto. Já tentei ler o Moby Dick e acabei por desistir a meio. Decidi dar segunda chance num livro muito mais pequeno, em que Herman Melville conta mais uma história acerca de marinheiros.
Eu gosto da escrita de Melville. Há algo de suis generis na forma de ele escrever que me agrada. Não sei se são as analogias que ele volta e meia usa para descrever algo, ou se será a sensação de oralidade no livro. Isto é, muitas vezes é como se ele nos estivesse a contar a história de boca numa taberna qualquer e até de certa forma ao sabor daquilo que a memória lhe traz.

1Q84 - Haruki Murakami

Li este livro em inglês porque obviamente a tradução em português é a maior palhaçada e estupidez que já vi em termos de traduções para português. Em cima de uma tradução medíocre acrescentem a tempestade convulsiva de notas extemporâneas e descabidas, gentileza da nossa querida Maria não sei quê (desculpem lá, mas fico tão ultrajado que nem me apetece ir procurar o nome da senhora. Já sei que irei dar a um certo clube de fans que masturba o ego da senhora e agora não me apetece).
Eu li os três livros em inglês e não vi uma única nota (NENHUMA). Folheei o livro na fnac em português e encontrei notas que até me fizeram tremer as pernas.
De qualquer das formas, a edição que eu li é uma belíssima edição em capa dura em que vêm os três livros juntos, portanto para mim o 1Q84 livros um, dois e três, são para mim apenas um, apesar de vir mencionada no livro a separação entre livros.
Demorei bastante tempo para o ler e isso acabou por prejudicar a apreciação do livro. Achei que, ao contrário de outros livros dele, nada de espantoso acontece e a narrativa segue um caminho calmo e, diria mesmo até, previsível. As personagens são muito boas, como de costume nos livros dele, e a história tem muito de surreal. A escrita, bem, é a escrita de Murakami, que só lendo é que se poderá explicar. Penso que a minha impressão do livro poderia ser melhor se o tivesse lido num menor espaço de tempo, mas bem, talvez numa próxima.

Pole to Pole - Michael Palin

O meu Python favorito também faz documentários de viagens. Esta é uma viagem feita em 1991 desde o Polo Norte até ao Polo Sul e é um belo documento ao estado do mundo nessa altura. A viagem é feita junto à linha de 30º de longitude, que atravessa a maior parte em terra. Para chegar de um ponto ao outro é utilizado essencialmente transportes públicos, terrestres sempre que possível e marítimos ou aéreos nas restantes ocasiões.
Gosto neste livro do mesmo que gostei quando li Nova Europa. É a simplicidade com que a viagem se faz e o facto de na maior parte das vezes Palin comunicar com as pessoas e não com as grandes personalidades ou com presidentes das localidades onde passa. Normalmente acaba por falar com um artesão ou motorista ou feirante e, dessa forma, é possível ter uma perspectiva bastante simples e realista da verdadeira realidade em cada um dos lugares. O livro não é muito grande, mas quando lido as terras europeias atravessadas no início parecem muito distantes quando nos aproximamos do fim. A travessia de África é um documento acerca do estado de abandono desse continente, que muita gente gosta de ignorar. Li em inglês, dado que nem sequer existe edição deste livro em português.

E bem, hoje fico por aqui, talvez amanhã continue, dado que ainda li mais alguns livros este ano.

Porque gosto de Rurouni Kenshin (Samurai X)?

Uma nota prévia:

Este blog não tem tido a regularidade (que nunca foi muita de resto) que teve em outros tempos.

Reflectindo, essencialmente tenho escrito aqui sobre coisas variadas e essencialmente criticado a hipocrisia e falta de senso comum das pessoas de Portugal.

Contudo, cada vez mais me falta a vontade de me preocupar com isso, porque, na verdade, quem é que quer saber do que eu tenho ou não para dizer? E, por outro lado, sinto cada vez menos necessidade de vir aqui proclamar a minha discordância ou opinião.

De qualquer das formas, isto é apenas uma pequena nota para qualquer leitor deste blog que eventualmente o acompanhe.

Quanto à critica. Há várias criticas que me apetecem fazer. Mas na verdade, como descrito acima, falta-me vontade de falar dessas coisas. Parece-me uma perda de tempo desnecessária.

Posto isto, passo à razão de ser deste post.

Porque gosto de Rurouni Kenshin? Há tantas razões...



Rurouni Kenshin é um animé, relativamente antigo (1996), mais conhecido para estes lados como Samurai X. Foi transmitido na TVI (ou se calhar ainda era a 4 na altura). Na altura da transmissão eu devia ter uns 11 anos, talvez, e lembrava-me vagamente dessa personagem que era um samurai chamado Kenshin e que tinha uma cicatriz em forma de cruz na face. Até há pouco tempo era apenas uma memória vaga, mas que sempre relembrei com algum carinho porque realmente gostava dessa personagem. Contudo, recentemente, a minha querida Efémera, falou-me de um animé sobre um samurai que, pela descrição, me chamava alguma atenção, toda ela confirmada pelo nome. Rurouni Kenshin. Foi assim com alegria que vimos os dois este animé de 95 episódios que passam a voar. E assim também relembrei o porquê do meu carinho pela personagem.

Este animé conta a história de um samurai que viveu durante o Bakumatsu (período correspondente à queda do Shogunato e passagem ao Império Meiji no Séc. XIX). Bakumatsu foi um período de lei marcial em que era cada um por si, basicamente. Kenshin era um hitokiri (traduzido no português como esquartejador, mas na verdade seria mais um assassino profissional) temido pela sua habilidade de espadachim e conhecido como Hitokiri Battousai (Battousai vem de Battoujutsu, que é o ataque  ao desembainhar a espada, no qual Kenshin é especialista). O animé passa-se 10 anos depois do Bakumatsu, no período Meiji de paz e Kenshim é um rurouni (wanderer em inglês que nas nossas traduções era vagabundo). É contudo um rurouni que tem um compromisso de não matar, após o período sangrento que havia atravessado, e que se comprometeu a defender as pessoas com que se cruzasse usando a sua espada com gume invertido (sakabato).

É neste contexto que se desenvolve o animé. Kenshin encontra pessoas das quais fica amigo, contudo no seu coração permanecem todos os problemas de ter sido um assassino temido durante o Bakumatsu. Tão característica cicatriz na cara, faz com que o seu passado nunca seja esquecido, aparecendo, sucessivamente, adversários com sede de derrotar o lendário hitokiri. O enredo desenvolve-se de forma bastante interessante, mas não vou descrever aqui porque vocês podem querer ver depois.

Apenas vou dizer que o que me faz gostar bastante deste animé são várias coisas.



A personalidade de Kenshin Himura é algo que me comove profundamente. Aqui está alguém que percorreu um caminho de sangue, que era um espadachim formidável e o mais temido, que deixou um rasto de sangue e que desapareceu após o Bakumatsu. Apesar disso é a personagem mais amável, razoável e compreensiva. Não obstante todos os conflitos entre ser um assassino ou não e todos os problemas e oportunidades que o seu passado lhe apresente, ele mantém-se fiel ao seu voto. Não matar. A generosidade desta personagem é enorme e, quando vejo, só tenho vontade que o deixem em paz e parem de o atormentar com o passado que já é de si um tormento constante.

A camaradagem neste animé é algo que também me satisfaz bastante. A forma como a lealdade é um princípio tão importante e tão indispensável para algumas personagens que se mantêm juntas, aconteça o que acontecer.

De entre as personagens há delas simplesmente apaixonantes, para além do próprio Kenshin.

Kaoru Kamiya, é a principal companheira de Kenshin durante o animé e a sua determinação junto com a sua atitude um tanto ou quanto desajeitada fazem com que esta seja uma personagem bastante magnética e com a qual simpatizo muito.



Sanosuke Sagara é o lutador que luta por lutar e que é um bocado (bastante) "reckless" mas que no seu âmago valoriza a lealdade pelos seus amigos, pelos seus princípios e pelo seu passado. E nunca desiste, nem rejeita uma boa luta, claro.



Saito Hajime. Um antigo capitão dos Shinsengumi (brigada especial de samurais pro-shogunato). Espadachim fantástico que segue o seu lema à risca. O seu lema é Aku Soku Zan (tradução livre seria "eliminar o mal imediatamente"). No período Meiji passa a ser um polícia especial mas o seu lema é o mesmo. A sua polaridade com Kenshin (eram inimigos durante o Bakumatsu) é bastante interessante de seguir e a luta que existe entre os dois durante o animé é memorável. Eu gosto da convicção desta personagem. A forma como não se desvia dos seus ideais por nada e como compreende que o mundo é diferente, mas os ideais dele são o mais importante. E a voz dele (em japonês) é algo por demais adequado ao personagem. De resto a voz é adequada em todas as outras personagens, mas aqui um pouco mais que no resto.



Hiko Seijuro. O mestre de Kenshin. Uma pessoa simplesmente demasiado espectacular para existir. Um homem extremamente forte e inteligente, mas que prefere estar afastado de tudo a fazer potes de cerâmica e a meditar, em vez de usar as suas capacidades em prol do que quer que seja. A sua leve arrogância e a perfeita consciência das suas super capacidades tornam esta personagem absolutamente irresistível.



Finalmente, e finda a parte das personagens, uma coisa que me agrada muito neste animé é a conexão com a história real do Japão.

O Bakumatsu foi de facto um período verdadeiro. Aconteceu de facto e neste período a luta nas ruas centrava-se entre Shinsengumi (pro-shogunato) VS Clãs pro-imperialistas.

Os Shinsengumi existiram de verdade e o comandante do 3º Esquadrão chamava-se Saito Hajime. Este era de facto um espadachim fora do normal temido entre todos e até mesmo pelos próprios Shinsengumi, pois Saito Hajime matou outros Shinsengumi por estes estarem a fugir aos ideais do grupo, daí provavelmente na versão ficcionada o autor do Manga lhe tenha dado o lema de Aku Soku Zan, porque o verdadeiro Saito Hajime guiava-se por essa directiva. O verdadeiro Saito Hajime também se tornou num agente especial da polícia japonesa, tal como no animé.

Os Clãs Imperialistas lutavam nas ruas e usavam Hitokiris para assassinatos especiais. Um Hitokiri era alguém com capacidades de espadachim fora do comum, capazes de matar os samurais "normais" de forma muito fácil e quase sem esforço. Estes Hitokiri eram então usados para assassinar figuras chave do Shogunato, durante a noite.

Kenshin Himura é baseado num Hitokiri que existiu chamado Gensai Kawakami. Kawakami foi um Hitokiri que se tornou conhecido pela sua estrutura franzina, quase efeminada (tal como Kenshin) e especializou-se no seu Battoujutsu (tal como Kenshin). Criou o seu próprio estilo chamado Shiranui que consistia em prever os movimentos do adversário e usar da rapidez que o seu corpo frazino proporcionava para atacar mais depressa. (Kenshin Himura usa o estilo fictício Hiten Mitsurugi, que podia ser descrito com as mesmas palavras que descrevi o Shiranui).

Esta conexão com a verdadeira história do Japão é fascinante. Muitas das temáticas da história do animé têm a ver com o ajuste que os samurais tiveram de fazer entre o Bakumatsu (período de guerra total) e o período Meiji (período de paz onde era proibido andar com espada). Muitos desses samurais foram presos ou assassinados e os Hitokiri tiveram na sua maior parte o mesmo destino. Em Rurouni Kenshin o problema do samurai inadaptado é constante e esse problema também foi constante durante os primeiros anos da era Meiji real.

Ao rever este animé percebo perfeitamente porque é que enquanto criança gostava tanto de o ver e hoje ainda gosto mais!

P.S. - Se houver alguma incorrecção nos termos japonês, não se preocupem em fazer notar, não escaparei impune de qualquer das maneiras. Há-de haver uma certa pessoa que se encarregará de me dar uma boa palestra acerca de qualquer erro que eu dê :)

25 de Abril de 2013

A todos os palhaços que há 39 anos dizem sempre a mesma merda e a todos os palhaços que desde então decidem dizer a mesma merda:

A memória é muito importante para o futuro de uma nação. É necessário relembrar tudo de mau e tudo de bom para que haja cada vez mais bom e cada vez menos mau. Contudo, a memória por si só, nada faz.

Desta forma entristece-me que em Portugal, ao fim de 39 anos ainda continuamos a viver o 25 de Abril de 1974 da mesma forma que o vivemos a 26 de Abril de 1974. Ainda estamos maravilhados com a revolução e com as promessas de uma nova era. Ainda estamos à espera que tudo se concretize num reflexo digno do Sebastianismo. Ainda elogiamos os Capitães de Abril como se não houvesse amanhã e legitimamos os mesmos a falar de coisas que não sabem e de forma arbitrária.

A única diferença é que agora queixam-se que o 25 de Abril não era suposto ser assim.

Francamente, já estou farto de celebrar o 25 de Abril (ou ver as celebrações). É sempre a mesma merda pomposa e de encher o peito. O orgulho do dia e não o orgulho da mudança. O relembrar de quem fez a revolução e o esquecer (e perdoar) de todas as pessoas que desde então esqueceram-se que também elas têm o dever de continuar essa mesma revolução. Todas as pessoas que batem no seu peito em lisonja e dão palmadas das costas de uma liberdade, da qual, na verdade, pouco querem saber a não ser que seja a sua liberdade posta em causa.

Toda a gente se esquece que a revolução acontece todos os dias e todos nós somos (ou deveríamos ser) parte dela. Todas as nossas acções contribuem para a construção de um país melhor e mais justo. Se é verdade que é importante relembrar o passado é também importante relembrar que é o presente que constroi o futuro e não o passado.

Hoje, mais importante que o 25 de Abril de 1974 é o 27 de Abril de 2013. É hoje que importa e é hoje que nos devemos comportar à altura daquilo que (supostamente) queremos atingir.

Já chega de falar de liberdades condicionadas quando muitas delas são condicionadas pelo próprio povo. Já chega de falar dos direitos que nos foram revogados, quando muitos deles nem sequer fazem o menor sentido.

Agora é hora das pessoas exercerem não só a sua liberdade em participar em manifestações inúteis e desprovidas de valor (e muitas vezes de sentido). É hora sim de exercer a liberdade de participar na vida pública. Se acham que podem fazer melhor, proponham-se a fazer melhor. É hora de todos no dia a dia actuarem como cidadãos de um país livre e não como cidadãos de um submundo onde apenas o nosso bem estar importa e onde apenas lutamos para estar melhor que os outros.

Agora é hora do presente e não de vangloriar um passado que não é nada mais do que isso, um passado. Importante mas apenas para ser recordado como factor a considerar em decisões futuras. E só lutando pelo presente conseguiremos atingir os ideais do 25 de Abril de 1974.

My Generation

Estou um tanto ou quanto cheio de ouvir a seguinte palermice.

"Eu sou da geração que brincava na rua! Não tinha telemóvel! Não tinha PS3! Jogava à bola na rua e sujava-me todo.. " etc etc

Por acaso, até pertenço a parte desta geração. Tendo nascido na segunda metade da década de 80 também brinquei na rua, também não tinha PlayStation (até certa altura), também não tinha telemóvel (o primeiro que tive foi aos quinze).

Jogava à bola onde calhava, improvisava jogos de ténis sem rede e sem raquetes e dava infindáveis voltas de bicicleta, desde que o tempo o proporcionasse. Brincava às escondidas e, passatempo preferido, era tentar atravessar o terreno do meu avô, composto por várias casas, sem ser visto. Até walkie talkies arranjei para poder comunicar nos meus parceiros de crime (leia-se, brincadeira).

Mas a pergunta que se coloca é:

E depois?

Tudo o que existia de bom na altura, continua a existir e tudo o que existia de mau, continua a existir. Quando muito, as coisas boas e as coisas más, são apenas amplificadas pela realidade de hoje em dia em que tudo é mais importante do que aquilo que realmente parece. As tragédias (uma maneira de dizer, porque refiro-me aos pequenos e irrelevantes dramas individuais) são mais trágicas e as comédias são mais cómicas.

A minha geração tem pouco de que se possa orgulhar. É a geração que ficou em cima da ponte e, por sua vez, entupiu o caminho para quem veio a seguir. É a geração daqueles que nunca decidiram se continuavam os estudos para além do 9º ano (sim, em 2000 era isso que se discutia) e mais tarde após terem feito o 12º nunca se decidiu realmente se ia para a universidade ou ficava-se por ali. Uns foram, outros ficaram.

Os que foram acharam que com um canudo a vida era um mar de rosas e que emprego seria garantido. Os que ficaram acharam que iam trabalhar e finalmente atingiriam a emancipação. Eu fui dos que fiquei pelo 12º. Mas nunca tive grande desejo de emancipação. E também não é que tivesse grande escolha. Devido às condições financeiras da minha família (bastante carenciada nessa altura) a minha opção era trabalhar e mais nada. Não havia cá dinheiro para sustentar um filho na universidade. É claro que quem foi para a universidade acabou por descobrir que o tempo dos pais deles já tinha passado. O tempo em que bastava ser licenciado para ter emprego já passara e agora um licenciado é apenas mais um. Os que não foram, descobriram que afinal era melhor estar na escola, naquela altura em que toda a gente se queixava de já ter estudado muitos anos.

Obviamente, hoje em dia, gostaria de ter um curso universitário e já me candidatei com sucesso a um. Contudo pelo trabalho fui impossibilitado de ir e, lá no fundo, ainda não decidi o que quereria estudar. História? Estudos Culturais? Estudos Clássicos? Línguas? Enfim, há muita coisa que eu gostaria de saber e em fases diferentes sinto vontades diferentes, por isso, e por não ter grande possibilidade de tempo de ir para a universidade, vou adiando a decisão de lá entrar e em que área. Tenho, porém, a certeza que quando quiser entrar em alguma área de interesse entrarei com 100% de certeza. Não sinto qualquer temor pela fase de acesso.

De qualquer das formas, voltando à minha geração. O que foi que ganhamos em brincar na rua? Nada. Burros vão ser burros e há burros em todas as gerações. O problema não são os burros em si. No mundo animal os mais fortes são quem sobrevive, mas no mundo humano os burros por vezes têm sorte e é desses que reza a história porque foram esses que nos colocaram em condições péssimas.

Tantos os da minha geração como os das gerações anteriores.
Não quero fazer a apologia dos mais fortes sobre os mais fracos. Nunca o faria, porque uma coisa é ser frágil e outra é ser palerma. Uma pessoa frágil e inteligente deve ser protegida.

Todas as gerações sofrem do mesmo mal. Todas as gerações são geradas e geram humanos. E onde há humanos há borrada na certa. Portanto que é que interessa se eu jogava Atari e agora se joga Xbox? Que é que interessa se há telemóveis ou telefones? Eu respondo. Não interessa absolutamente nada.

Por isso deixem-se lá de tentativas de superiorização porque são de 80 ou de 70 ou o que quer que seja. E ganhem juízo, porque só um palerma abestado para ter este argumento.

P.S - Quero esclarecer que o problema da afirmação da geração que fazia coisas diferentes, reside no facto de ser uma tentativa de superiorização. Não estamos a falar de pessoas que querem apenas recordar os bons velhos tempos. São pessoas que acham que brincar apenas na rua. E que crescer apenas sem telemóvel e sem computadores ou consolas. Se a intenção fosse recordar os velhos tempos, por mim não haveria problema nenhum. O problema reside na ideia que por ser diferente era, necessariamente, melhor.

O silêncio

Hoje falo de um tema com o qual convivo bastante. O silêncio.

Em consequência da minha convivência com o silêncio, tenho obviamente mais que tempo para pensar nele e na importância do silêncio.

E porque convivo eu muito tempo com o silêncio? Basicamente a minha rotina diária resume-se ao seguinte: levantar às cinco/seis da tarde; comer algo; passar tempo; jantar; passar tempo; trabalhar com entrada à meia noite; sair às oito; ir ao ginásio; dormir. Em passar tempo leia-se internet (facebook NÃO NÃO), ouvir música, tocar música, ler, etc.

O meu trabalho nocturno significa que, muitas vezes, entre a saída do meu colega que venho substituir e a chegada do que me vem substituir, não vejo praticamente ninguém. Consequentemente, não falo para ninguém. Os reflexos físicos desta condição são a dificuldade em aclarar a voz, quando finalmente falo com alguém. Mas obviamente, não estou aqui para falar das dificuldades físicas (que são insignificantes, já agora) que sinto quando vou falar com alguém.

Posto isto, se estou acordado à volta de 17 horas por dia, oito delas são preenchidas por um silêncio sepulcral. Não há música, não há filmes e não há sequer barulhos distantes de carros que passam em direcção a destinos incertos. Isto não é uma queixa, é apenas um facto para enquadrar o ponto seguinte.

Dediquei, e continuo a dedicar, muito tempo a pensar sobre a importância do silêncio. Quão importante é o silêncio? Eu diria que é extremamente importante, embora muita gente, se calhar, nunca sequer pensou nisso.

Conviver com o silêncio não é fácil, muitas vezes. Lembro-me perfeitamente que quando comecei a trabalhar neste horário nocturno frequentemente dava por mim a responder a diálogos imaginários que nunca tive nem terei com ninguém. Dei por mim muitas vezes a rir-me, não sei bem do quê. Obviamente estes problemas não têm apenas a ver com o facto de estar em silêncio, mas têm também haver com o Ciclo Circadiano que, no caso das pessoas que trabalham de noite, fica severamente perturbado.

Quero acrescentar também que o facto de estar a trabalhar em nada influi a questão do silêncio. Se bem que é um trabalho mentalmente exigente (até certo ponto, claro está, não sou nenhum cientista) é um trabalho que faço perfeitamente sem pensar muito nele.

Então, porque é que o silêncio é importante? Importa perceber o que acontece quando estamos em silêncio.
Quando em silêncio total e ausente de acções distractivas estamos na companhia de nós próprios. Pessoalmente, sinto nestes momentos que sou duas pessoas diferentes. Uma que questiona e outra que responde, numa espécie de jogo de ténis. Há muita gente que fala com muita gente e que evita ficar sozinha, talvez pelo receio (ainda que distante ou não admitido) de se auto-confrontarem. Não é de todo o meu caso, dado que não sou de falar muito e, na verdade, estando a trabalhar não posso sair ou estar aqui a ligar para não sei quem. Também não o faria, de qualquer das formas. Vivo perfeitamente bem comigo mesmo e aprecio bastante o meu silêncio.

Enquanto em silêncio posso pensar em tudo o que me apetece, tecer todas as teorias que me apeteçam, imaginar todos os cenários possíveis e impossíveis. Obviamente, há momentos perturbadores. Há momentos em que a angústia facilmente envolve todo o silêncio e transforma-o num poço de ansiedades e essa angústia é praticamente impossível de afastar nesses dias. E nesses dias pensa-se em tudo o que há de mau. Auto estima atinge valores negativos, as soluções parecem todas demasiado distantes e falíveis, tudo o que parecia certo parece errado e todas as convulsões se precipitam. Desde o choro à hipótese de morrer. E é nestes momentos que custa mais estar em silêncio, num lugar ermo, no meio de uma montanha com vista para um vale onde as luzes brilham lá em baixo. Estáticas como o gelo. Sintetizando, é desesperante.

Felizmente esses momentos são poucos, mas, na maior parte das vezes, são consequências da perturbação do silêncio que somos vítimas. Seja na forma de ouvirmos demasiado o exterior ou seja na forma de um evento qualquer que nos causa reacções negativas.

O silêncio é importante porque as piores e mais difíceis lutas são as que travamos dentro de nós. É quando não podemos chamar ninguém para vir resolver o nosso conflicto. É quando estamos constantemente a dizer para nós próprios que não vamos pensar mais nisso, apenas para segundos depois pensarmos ainda com mais força. Ao longo dos anos aprendi a lidar com isso. Aprendi a confrontar-me constantemente. E continuo a confrontar-me. Ainda ontem escrevi aqui um post bem maior do que este, apenas para o apagar no fim, por não sentir que fosse adequado (por uma miríade de motivos).

O que fiz? Como fiz? O que faço? Como faço? O que farei? Como farei? Seis perguntas que resumem muito daquilo que penso, quando me confronto a mim próprio.

Obviamente penso também em muitas coisas externas. Situações, pessoas, objectos etc. Penso no que está a acontecer à minha volta. Socialmente, politicamente e historicamente.

Penso noutras pessoas. O exercício de imaginar o que estão a fazer a certa hora da madrugada é demasiado tentador para lhe resistir, embora certamente que a maior parte está a dormir, mas bem, penso em tudo isso na mesma e nos momentos em que concluo que estarão a dormir sinto-me como um supervisor do sono dessas pessoas. Sinto-me como se estivesse a velar pelo sono delas. E sinto isso relativamente a muito mais pessoas do que aquelas que provavelmente devia. Esse sentimento de estar a velar o sono dos outros é ainda maior quando me encontro a observar a paisagem implacável e sinistra que a noite provoca, paisagem essa que consiste em vales e montanhas tão distantes quanto a vista consegue alcançar. Eu vejo aquelas luzes lá no fundo, que estarão a cerca de 40km de mim e sinto um misto de conforto e compaixão pois essas pessoas existem lá longe, mas não passam de um ponto no escuro, sem qualquer tipo de esperança na vastidão da noite. E do silêncio. Pois se eu estivesse com mais alguém, nunca iria ter tempo para reflectir sobre todas essas hipóteses, cenários e congeminações da minha consciência.

O silêncio permite-me ver tudo ao contrário. E se fosse tudo ao contrário? Seria provavelmente tudo o mesmo, num estranho equilíbrio cósmico (contudo,não mais estranho que o actual).

O silêncio é importante para que todas as dimensões de um ser humano se revelem da forma mais profunda. É importante para que se pense, para que se reflicta, até para que filosofemos um pouco (ou muito). Sem esse silêncio nunca nos encontraremos com nós próprios. Provavelmente maior parte das pessoas nunca se irá encontrar com ela própria, porque simplesmente, não há espaço para pensar. Não há silêncio para reflectir.

A invasão deste silêncio é algo que prolifera hoje em dia. Se o meu ritmo de vida propicia o silêncio, vejamos o hipotético ritmo de vida normal. De um estudante universitário por exemplo.

Levantar às sete/oito; Aulas às nove: almoçar; aulas; ir para casa; estudar (vamos ser crentes); jantar; estudar mais um bocado; passar tempo; dormir.
Note-se que neste caso, passar tempo é certamente estar no facebosta.

Obviamente quando é que esta pessoa poderá estar em silêncio? Pouco tempo, porque voluntariamente ninguém vai para um canto reflectir (Eu iria, e alguns mais também, mas somos uma percentagem tão pequena que pronto, ninguém é ok). E também não se trata de ir para um canto reflectir. Trata-se apenas de pensar ainda que alguém possa estar a fazer um alto nível de decibéis. Mas bem, o que quero dizer é que é simplesmente uma rotina com demasiados momentos de distracção desse silêncio.

Mais do que estar calado, silêncio é pensar. É abstrair a nossa cabeça de todas as tentações e distracções que existem e pensar com a NOSSA cabeça. Não deixar que ele seja invadido.

Se deixarmos o nosso silêncio ser invadido, passaremos a vida a viver pelos outros. E não por nós. A partir do momento em que perdemos o nosso silêncio interior tudo vai ser dependente do exterior.

Por isso é que o silêncio é importante. Passar todos os dias oito horas sozinhos, sem passatempos, todos os dias, é se calhar pedir de mais, mas um dia é certamente algo que toda a gente deveria tentar, pois muita gente, apenas assim conseguiria sentir tudo aquilo que é estar em silêncio e ter dificuldades em falar ao fim dessas oito horas. A dificuldade física em nada se compara à dificuldade intelectual de sermos nós próprios com nós próprios durante esse tempo.

Mas bem, no fim de tudo, sinto que este post é um bocado incipiente, mas paciência. Só hoje ainda terei mais quatro horas de silêncio para pensar nisto.

Estupidez portuguesa Vol MCLXIII

Ultimamente a minha vontade de escrever no blog é pouca. Francamente, estou um bocado cansado de ventilar as minhas opiniões em direcção a um vasto mar que não quer ouvir.

Assim sendo, a minha solução tem sido ignorar, praticamente tudo, o que passa nas notícias e tudo o que vejo em caixas de comentários e outros blogues e facebooks etc.

O meu fastio para com as pessoas vai muito para além de manifestarem opiniões estúpidas hoje em dia. Não sou muito bom a decorar citações mas diria que "as pessoas não têm direito a ter opinião, têm direito a ter opinião informada, porque ninguém tem direito a ser ignorante". Não sei se a citação seria exactamente assim e também não me lembro quem é que a fez, mas eu revejo-me completamente nesse ponto de vista.

Mas, como disse, não é a ignorância das pessoas que me incomoda mais nestes dias. O que me incomoda é a hipocrisia da liberdade que as pessoas defendem hoje em dia.

A liberdade que te permite exprimir uma opinião, desde que a mesma seja conivente com a opinião da maioria. Maioria essa comprovadamente ignorante.

Há uns tempos, houve uma celeuma qualquer por causa de um problema num comboio. O tipo que tinha um cão e que não tinha bilhete para o animal. Aparte da verdadeira "verdade" do assunto, isto é, aparte de sabermos se o revisor e a polícia tinham razão ou se o tipo é que tinha razão, importa ressaltar o seguinte:
No vídeo do YouTube ler a secção dos comentários era penoso porque maior parte das pessoas limitava-se a dizer banalidades e a bater no ceguinho. Mas é preciso observar todos os comentários escondidos por reportes de spam ou por demasiados votos negativos. Esses comentários eram os comentários contrários à opinião da maioria. E enquanto a questão dos votos negativos até compreendo, a questão do spam é simplesmente a tentativa estúpida de esconder aquilo que não nos interessa. É uma forma de desvalorizar a outra opinião sem que tenhamos uma resposta para mesma. E é um grande exemplo de como a versão de liberdade da maior parte das pessoas está deturpada.

E repito, mais uma vez, que a questão não é quem tem razão, mas sim, porque é que as pessoas acham que podem definir nos seus próprios termos a liberdade que a tão fundos pulmões proclamam.

Em Portugal (e se calhar noutros sítios também, mas esta é que é a minha realidade) só se pode ser pelo rebanho, de contrário não percebemos nada e não sabemos o que estamos a dizer.
Podemos aclamar a coragem do povo português em se manifestar, mas não podemos falar de algumas imagens em que se viam os cafés cheios de gente a beber a sua cerveja, porque afinal queixam-se que não há dinheiro, mas podem pôr a tão importante manifestação em espera, para poderem saciar a sua sede, não com água, mas com finos e tremoços.

É irónico, hilariante e triste. Tudo ao mesmo tempo, mas é uma verdade dos portugueses. Nunca nos conseguimos pôr noutro ponto de vista. Apenas o nosso. Um português que ganhe 2000€ não abdicaria sem problemas de 50€ do seu salário nem que isso curasse a fome no mundo. A luta continua, pena que não lutem contra aquilo que devem.

Cinema e estupidez

É recente a notícia de que a Castello Lopes vai fechar 40 e não sei quantas salas de cinema.

Para mim, não me faz grande diferença, francamente, vou ao cinema de meio em meio ano e não me importa de andar mais um bocado, principalmente porque, normalmente vou ver filmes que quase garantidamente vão ser bons.

Contudo é sempre hilariante observar a quantidade de diarreia que flui da boca de certos parvalhões. Aliás, reescreverei esta frase da mesma forma que a diria na realidade.

Contudo é sempre hilariante constatar a quantidade de merda que certas cabeças de unto sem coluna vertebral dizem.

A ACAPOR, essa associação subterrânea, que até ao fecho de uns sites famosos na internet, nunca ninguém tinha ouvido falar, veio já dizer merda acerca daquilo que parece saber muito, mas que na verdade, não parece saber nada.

Citando o Correio da Manha (pun intended)

Para a Associação do Comércio Audiovisual de Obras Culturais (ACAPOR), a causa para estes fechos é a partilha ilegal de conteúdos na internet e endereçou às exibidoras – menos a Zon – o convite para avançarem com uma queixa contra o Estado. Em causa, está a “gritante inércia no combate à pirataria na internet” e a ausência de respostas legais.
Sobre o tema, fonte a Zon diz que a pirataria “tem-se agravado” e está a atingir “volumes que colocam em risco a própria sobrevivência do negócio de distribuição de conteúdos”.

A minha reacção em imagens.

Eu posso ser um simples bastardo inculto por não ir ao cinema. Mas bem, vamos virar um bocado os papéis e eu vou imaginar que sou director da ZON, ou da Castello Lopes, ou macaco (huehue) treinado da ACAPOR.

Ora então, se eu estivesse no lugar dessas pessoas pensava o seguinte. Qual é o atractivo de ir ao cinema? É ver um filme. Obviamente, mas hoje em dia, isso é o suficiente para sair de casa? Quando sabemos que pelo preço de dois bilhetes podemos comprar na internet os filmes um pouco mais tarde?

Eu penso que não. O valor de um bilhete normal é 6 a 7€. Por dois bilhetes, 12 a 14, compram-se DVDs na Amazon. DVDs esses que poderemos ver e rever e voltar a ver quantas vezes quisermos.

Portanto, daqui se deduz que a motivação de ir ao cinema não é ver o filme apenas. Afinal qual é a motivação de ir ao cinema, então?

Eu quando vou ver um filme, normalmente janto fora, faço um "programa" diferente. Não há nenhum cinema onde eu tenha ido que tivesse um agradável restaurante incorporado. Se eu tivesse uma cadeia de cinemas, trataria de efectuar contratos de exploração de espaços para restaurantes abertos ao público mas com predominância e favorecimento daqueles que vão ver filmes. E podem dizer que normalmente os cinemas estão em centros comerciais. o que é verdade, mas poucos centros comerciais têm um restaurante digno desse nome. Daqueles fechados onde nós entramos e sentamos tranquilamente sem a agitação das praças de alimentação. Tenho a certeza que se houvesse um restaurante em que o preço médio para duas pessoas ficasse por 25-30€ (sem bebidas e já com o bilhete incluído) haveria muita gente a ir. Era preciso era ser um bom restaurante no sentido tradicional da palavra. Obviamente não poderia ser um McDonalds.

Outro ponto em que os cinemas portugueses dormem forte e feio. Não nenhum tipo de cartão de cliente realmente válido para aqueles que gostam muito de cinema. E isto é daquelas coisas que até os detentores de ginásio se aperceberam, ganha-se mais dinheiro ao vender um cartão de visitas mensal do que a vender uma visita de cada vez. Fideliza-se mais e cria-se um hábito no espectador de cinema. Cria-se um hábito em ver o filme quando sai que, devo dizer, para quem gosta deve ser bastante agradável. Se uma pessoa for duas vezes por semana ao cinema a 6€ cada bilhete, gasta 48€. É dinheiro que muita gente não pode gastar. Agora, se houvesse um cartão em que por 30€ fosse possível ver dois filmes por semana, aí tínhamos logo mais cinéfilos interessados em ir ao cinema regularmente.

O ponto anterior leva a outro ponto importante que é o facto de os cartazes dos cinemas mais populares (ZON Lusomundo e Castello Lopes) serem a monotonia geral. São os mesmos filmes em todas as salas ainda que haja mais do que um complexo de cinemas em certas cidades, porém, dão todos a mesma coisa. 
Se os cinemas querem atrair clientes fiéis têm que entender que as comédias românticas não vão chamar esses fiéis admiradores de cinema. Obviamente o efeito imediato desses filmes mais popularuchos é maior, mas a longo prazo não é. São apenas uma faísca que leva muita gente sem gosto algum pelo bom cinema a ir gastar o seu dinheirinho, porque muitas vezes não têm mais que fazer. Não vou estar aqui a fazer a apologia deste ou daquele filme porque nem sequer sou muito entendido, apenas falo do que vejo.

Resumindo o que é que os cinemas em Portugal têm para oferecer? Nada, para além de uma sala com boa projecção e com grande qualidade de som. De resto, nada. N-A-D-A. 

Os cinemas deveriam ser muito mais dinamizados. Pelo contrário quem promove os cinemas parece tratar aquilo como aquele mal necessário. Não há uma experiência associada à ida ao cinema. 

Por exemplo, fui ver o Hobbit. Jantei fora. Se o cinema tivesse um restaurante em condições, mais ou menos sossegado, eu iria lá jantar e depois sairia directamente para sala de cinema, onde de preferência iniciariam o filme a horas. Eu gostei bastante do filme e sou daquele tipo de pessoas que, à saída se visse no cinema uma pequena loja de merchandise com t-shirs, action figures, bobbleheads, pins etc, era bem capaz de comprar alguma coisa, contudo, essas lojas não existem em parte alguma. E depois do cinema, é possível ficar um pouco numa sala comum a tomar uma bebida e a conversar, quem sabe, com outras pessoas que tenham visto o filme e partilhar a opinião? Não, normalmente as saídas dos cinemas são aquele momento de caos em que as pessoas vão para a saída aos empurrões porque, para além de pipocas e pepsi, não há nada para fazer.

Posto isto, só um burro pode vir com a desculpa da pirataria como razão para os cinemas estarem vazios, porque os cinemas oferecem algo exclusivo, que é um filme novo com uma qualidade de exibição fora do normal. Contudo, está mais que visto que isso não basta. Está para se ver se algum dia os gestores dos cinemas vão entender isso.